segunda-feira, junho 30

That Summer Feeling


Estou no inferno.
Calma, não é do subterrâneo flamejante que estou falando. Me refiro ao período que antecede ao aniversário, o que as pessoas entendidas em astrologia (não é o meu caso, note bem) chamam de Inferno Astral.

Está lá, no Google: “Inferno Astral é o período de 30 dias que antecede a data de seu aniversário. Nessa época, a cada ano, você fica mais sensível e precisa se dar a si mesmo(a) mais atenção. Durante essa fase, recomenda-se fazer um balanço de sua vida e quando se deparar com problemas, esforce-se por resolvê-los.”

Bem, eu acredito nisso. Não sou aquele sujeito que lê seção de horóscopo nos jornais e revistas mas acho que estamos sujeitos a influências diversas por aqui e penso que Deus tem um plano para todos nós. Enfim, o que importa é o significado do tal “inferno astral”, que se reflete em uma profunda auto-analise sobre tudo.

Mais ou menos como o post sobre o novo disco do Weezer, me sinto fazendo constantes inventários sobre minha vida e meus atos. Ou a falta deles quando concluo que eram necessários. Às vezes esses balanços são menos felizes que outros mas, por piores que eles sejam, os fatos e pessoas vêm à minha mente sob a forma de música feliz, quase sempre da década de 1990. Apesar de lembrar até de coisas como o primeiro disco do Spin Doctors (e achá-lo bastante legal até hoje), minha trilha sonora aparece na forma de canções powerpop, que trazem em seu conceito, um link automático para os anos 70. Ou seja, é uma porrada dupla de nostalgia, uma lembrança da inspiração, causada pela...Lembrança.

Entenda: se eu batizo o post com essa expressão “that summer feeling”, não estou escolhendo algo bonitinho, mas sendo quase abduzido pelo poder melódico do Teenage Fanclub de 1995, que nos deu “Sparky’s Dream”, uma das favoritas de Inferno Astral, contida em seu disco Grand Prix.

Lembro de comprar a minha cópia desse álbum na antiga Spider, uma loja no segundo andar de uma galeria em Ipanema. Era um cubículo, mas o dono se mantinha sempre antenado com os sons que davam as cartas no exterior. Grande parte da minha coleção de britpop foi adquirida na Spider, além do revelador primeiro disco do Ben Folds Five, hit instantâneo entre os estudantes de Comunicação Social da Uerj em 1995.

Bem, a lembrança da década de 1990 (e dos anos 70, por tabela) não é casual, pelo contrário, aparece perfeitamente explicável para mim. Naquele tempo – putz, já vão uns quinze anos disso tudo – eu era um cara pronto para novos desafios, conhecendo gente jovem reunida, tentando não ser como meus pais e colecionando bons momentos. Estava mais magro, com mais cabelo, namorava uma das meninas mais lindas desse mundo, finalmente adentrava os domínios da Modern Sound com meus caraminguás e saía da poderosa loja de Copacabana com alguns discos.



Naquele tempo haviam três lojas de disco, lado a lado. A Billboard, a Gramophone e a Modern Sound, que sempre foi maior e mais sortida que as outras, porém, fraca em promoções e ofertas. A Gramophone, em cujos domínios encontrei um nervosíssimo Renato Russo, circa 1992, comprando discos de Cat Stevens e Joni Mitchell, era mais camarada com os preços e trazia um monte de lançamentos importados. A Billboard era a terceira em preferência, mas era legal. Com o tempo as duas lojas menores faliram e foram englobadas pela Modern Sound, assim como o antigo cinema Star Copacabana. Ou seja, os prédios foram exorcizados de seus espíritos originais e se contentaram em ser partes de um todo que antecipava o monopólio de venda de discos.

Aliás, me aflige pensar que minhas lembranças passam por algo que está tão démodé como o CD (rima não voluntária, claro). Sempre que penso em anos como 1992/93/94/95 o faço em forma de discos. Lembro deles, dos encartes, de chegar em casa e colocar no carrossel Sony de cinco discos e sugar as letras e perceber o quanto as conexões se estabeleciam com a minha vida.

Não me espanta, portanto, que eu esteja ouvindo bandas como Fountains Of Wayne, Teenage Fanclub e uma espécie de pai deles, o Raspeberries. Nesse balaio powerpop a justiça nunca se fez completamente. Sempre que falamos de formações desse estilo, seja nos anos 70 ou nos anos 90, pensamos em bandas subestimadas ou desconhecidas da maioria. Talvez seja simples pensar nos motivos disso.

Músicas “de verão”, com melodias beatle, guitarras desviadas do hard rock e cobertas de açúcar, além de vocais simpáticos cantando letras sobre amores impossíveis do high school nem sempre estiveram na moda, algo que não se aplica à minha pessoa, principalmente em inferno astral.

As lembranças de lugares como a Tijuca, Méier, Grajaú (bairros da Zona Norte do Rio), dos prédios da Uerj; de pessoas que nunca mais vi, de filmes como “O Balconista”, que se conectam com “Curtindo A Vida Adoidado” (assistido nas escadas do Cinema Leblon, numa tarde sold out após o colégio) e “A Nova Transa da Pantera Cor-de-Rosa” (filme de 1977 com o soberbo Peter Sellers, que eu via nas Sessões de Gala das noites), tudo isso é um looping de “summer feelings” na minha mente. Some a isso a crise da meia-idade chegando e você ter uma idéia do que passa por aqui.


Só mais um detalhe: o verão, essa estação do ano que parece tão presente em nosso Tropico de Capricórnio é algo raro no Hemisfério Norte. Lá, no lugar em que os compositores, artistas e personagens balizadores dos meus inventários nasceram, o sol é aguardado como quem espera quebrar correntes de jugo perpetuo para ser livre. No sentido mais amplo. O povo fica feliz, a neve derrete, o mundo é mais azul e faz todo o sentido cantar as músicas de verão. Assim como se faz necessário cantar as contrapartes de inverno, quando o mundo fica cinza.

No meu inferno astral, encerrando-se em dez dias, porém, o clima é de verão musical pleno e perpétuo, mesmo que a saudade seja um estranho tempero nesse milkshake de Ovomaltine, tomado no Bob’s da rua Domingos Ferreira, em Copacabana, ao lado do meu avô...

PS: Quem quiser dar uma olhada nos temas do inferno astral, precisa ouvir:

- Teenage Fanclub – Grand Prix (1995)
- Fountains Of Wayne – Fountains Of Wayne, Utopia Parkway (1996/1998)
- Raspberries – Live At Sunset Strip (2007)
- Ben Folds Five – Ben Folds Five (1995)
- Lemonheads – It’s A Shame About Ray (1993)
- Dinosaur Jr – Where You’ve Been (1992)
- Weezer – The Blue Album, Pinkerton (1994/1996)
- Neil Young – Harvest Moon (1992)
- Nirvana – Nevermind (1991)
- Pearl Jam – Ten/Vs (1991/93)

PPS: alguns clipes abaixo para "ilustrar" o post. Temos "Denise", com o Fountains Of Wayne, do disco Utopia Parkway (1998). A banda de Nova Jersey, liderada por Adam Schlesinger, atingia o topo das paradas pela primeira vez. Detalhe para a presença da atriz Jolene Blalock (que participaria da série Enterprise (da franquia Star Trek), no papel da subcomandante vulcana T'Pol. Depois vemos Ben Folds Five cantando "Philosophy" ao vivo, no programa de Jools Holland. E fechamos com "Sparky's Dream", do Teenage Fanclub.


3 comentários:

Adriano Mello Costa disse...

Vez ou outra me pego ancorando epocas da minha vida com discos tambem...eheh...Ate hoje escuto algumas faixas do primeiro album do Spin Doctors e o disco do Lemonheads passa frequentemente pelo player daqui...

giancarlo rufatto disse...

acho nunca ouvi um disco inteiro do fontains, nem sei porque.

CEL disse...

Recomendo o primeiro deles, de 1996 e o Utopia Parkway, de 1999. São duas pérolas pop douradas, não deixam nada a dever em relação ao Teenage Fanclub, por exemplo.
Também vale conferir o Girlfriend e o In Reverse, do Matthew Sweet.